29/11/2012

Parábola da Paz

Quem tiver ouvidos, ouça...

Era uma vez um empregado. Mas não era um empregado qualquer. Era um empregado daqueles que mandam em outros empregados. E era um dos empregados preferidos do chefe. Discreto, seriíssimo, acima de todas as suspeitas – até prova em contrário.

Era uma vez um chefe. Era do tipo malandro, metido a esperto e não tinha qualquer respeito por seus clientes. Dizia que tinha, fingia que tinha, mas estava mais interessado em si mesmo. Aumentar seu poder, multiplicar seus lucros, tornar-se imbatível, este era seu objetivo.


Certa vez, o empregado resolveu contrariar o chefe. Sem que este soubesse. Criou um produto novo, parecido com o que alguns concorrentes haviam criado em outros tempos, mas com eficácia aparentemente mais garantida. Foi um sucesso. De público e de crítica. Vendeu capas de jornais, anúncios publicitários. Virou moda.

De princípio, o chefe não havia gostado. Não havia percebido o potencial do produto que tinha em mãos. Não para os consumidores, claro. Para ele próprio, sobretudo. Mas quando percebeu não perdeu tempo: mandou produzir em massa. Mandou enviar para todos os cantos. Mandou beatificar o empregado. Resolveu classificar o seu produto como a maior descoberta da humanidade nos últimos dez séculos. Aliás, a maior invenção da História.

Por ter idealizado o produto, o empregado sabia de suas falhas. Sabia que precisaria de recall de tempos em tempos. Sabia que não era a maior maravilha do mundo. Que sequer resolveria metade dos problemas dos consumidores. Ao contrário, era só um alívio momentâneo, um produto que funcionaria apenas se conjugado a outros mais importantes. Contudo, muito leal a seu chefe, preferiu não contrariá-lo novamente. E compactuou com a farsa.

Estava criado o milagre. Fabricado em gabinete, exportado para outros lugares, elogiado mundo a fora. O chefe ficou mais rico, o empregado foi glorificado e o povo estava feliz - o povo que acompanhava as maravilhas do produto pela TV: as transformações que se dizia que ele havia feito; as vidas mudadas a partir de sua aquisição; a panacéia enfim instaurada.

Mas o produto, como previsto pelo empregado, tinha efeitos colaterais. O produto, veja só, não agradava a todos os seus consumidores diretos. O produto era bom, trazia boas sensações, satisfazia alguns desejos. Isso era inegável. Mas o momento inicial de alívio passou e a panacéia não veio. As vidas não mudaram. As transformações não foram profundas. O rótulo, enfim, era melhor que o produto em si. A propaganda não resistiu à realidade. A expectativa gerou frustração. E a frustração é a mãe de todas as revoluções.

Mas essa é outra História. Que ainda está sendo construída. E que pode transformar o produto. Ou descartá-lo. Ou não dar em nada. Ou... realmente está sendo construída? Essa é outra História. Que já começou. Que o empregado já previra. Que o chefe, mais uma vez, nem quer ouvir falar. Mas que começa a gritar. Aguardemos as próximas cenas. 


... não é paz, é medo.

Um comentário:

Luciano Neto disse...

tempão que não falo contigo, camarada.