Era uma vez um empregado. Mas não era um empregado qualquer.
Era um empregado daqueles que mandam em outros empregados. E era um dos
empregados preferidos do chefe. Discreto, seriíssimo, acima de todas as suspeitas
– até prova em contrário.
Era uma vez um chefe. Era do tipo malandro, metido a esperto
e não tinha qualquer respeito por seus clientes. Dizia que tinha, fingia que
tinha, mas estava mais interessado em si mesmo. Aumentar seu poder, multiplicar
seus lucros, tornar-se imbatível, este era seu objetivo.
Certa vez, o empregado resolveu contrariar o chefe. Sem que
este soubesse. Criou um produto novo, parecido com o que alguns concorrentes
haviam criado em outros tempos, mas com eficácia aparentemente mais garantida.
Foi um sucesso. De público e de crítica. Vendeu capas de jornais, anúncios
publicitários. Virou moda.
De princípio, o chefe não havia gostado. Não havia percebido
o potencial do produto que tinha em mãos. Não para os consumidores, claro. Para
ele próprio, sobretudo. Mas quando percebeu não perdeu tempo: mandou produzir
em massa. Mandou enviar para todos os cantos. Mandou beatificar o empregado.
Resolveu classificar o seu produto como a maior descoberta da humanidade nos
últimos dez séculos. Aliás, a maior invenção da História.
Por ter idealizado o produto, o empregado sabia de suas
falhas. Sabia que precisaria de recall de tempos em tempos. Sabia que não era a
maior maravilha do mundo. Que sequer resolveria metade dos problemas dos consumidores.
Ao contrário, era só um alívio momentâneo, um produto que funcionaria apenas se
conjugado a outros mais importantes. Contudo, muito leal a seu chefe, preferiu
não contrariá-lo novamente. E compactuou com a farsa.
Estava criado o milagre. Fabricado em gabinete, exportado
para outros lugares, elogiado mundo a fora. O chefe ficou mais rico, o
empregado foi glorificado e o povo estava feliz - o povo que acompanhava as
maravilhas do produto pela TV: as transformações que se dizia que ele havia
feito; as vidas mudadas a partir de sua aquisição; a panacéia enfim instaurada.
Mas o produto, como previsto pelo empregado, tinha efeitos
colaterais. O produto, veja só, não agradava a todos os seus consumidores
diretos. O produto era bom, trazia boas sensações, satisfazia alguns desejos.
Isso era inegável. Mas o momento inicial de alívio passou e a panacéia não
veio. As vidas não mudaram. As transformações não foram profundas. O rótulo,
enfim, era melhor que o produto em si. A propaganda não resistiu à realidade. A
expectativa gerou frustração. E a frustração é a mãe de todas as revoluções.
Mas essa é outra História. Que ainda está sendo construída.
E que pode transformar o produto. Ou descartá-lo. Ou não dar em nada. Ou...
realmente está sendo construída? Essa é outra História. Que já começou. Que o
empregado já previra. Que o chefe, mais uma vez, nem quer ouvir falar. Mas que
começa a gritar. Aguardemos as próximas cenas.
... não é paz, é medo.
Um comentário:
tempão que não falo contigo, camarada.
Postar um comentário