Lula, silêncio por favor. Os da Casa Grande estão irritados.
Assim um jornalista argentino termina seu artigo sobre a posição da imprensa brasileira em relação ao título de Doutor Honoris Causa recebido por Lula essa semana. Explico: o ex-presidente foi escolhido por unanimidade para receber a homenagem pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris - o Sciences-po. O instituto é um dos mais prestigiados do mundo e em seus 140 anos já abrigou “a nata da elite francesa”, como os ex-presidentes Jacques Chirac e François Mitterrand. Apenas 15 pessoas já haviam sido contempladas com a honraria e Lula foi o primeiro latino-americano a recebê-la.
Enfim, imaginam a histeria por aqui, não é? Porque o torneiro mecânico não se contentou em ser presidente. Foi presidente, tirou 30 milhões da miséria, saiu com 80% de popularidade, se tornou prestigiado em todo o mundo. E isso irrita. Irrita porque, parafraseando-o, esse país não foi pensado para ser governado pelos que estão no andar de baixo. E quem ousa desafiar essa regra não pode ficar impune.
Em uma entrevista coletiva concedida pelo diretor do instituto, Richard Descoings, a primeira pergunta, vinda de um grande e respeitado jornal brasileiro, foi a seguinte: “Por que Lula e não Fernando Henrique Cardoso, seu antecessor, para receber uma homenagem da instituição?”. Não é mentira. Está no site do jornal. A pergunta seguinte, também de jornalistas brasileiros, questionava do motivo de um prêmio entregue a alguém que se orgulhava de nunca ter lido um livro. Em seguida, no mesmo tom: “Por que premiam a um presidente que tolerou a corrupção?”. O nível continuou o mesmo e outro coleguinha brasileiro foi ao ponto, usando-se de ironia: seria essa premiação do Lula parte da política de ação afirmativa do Sciences Po?
O Brasil avançou muito nesses oito anos, mas parte da elite brasileira segue estagnada, sem ter movido um músculo, dado um passo sequer rumo à superação da pior das mazelas e misérias de uma nação, o preconceito. Separei quatro comentários de leitores à notícia da premiação de Lula. Ilustram bem o que digo. Vejam:
1 - “Gostaria de saber quanto o metalúrgico/enganador está pagando para receber "eçças" honrarias. Pois não tem outra explicação”
2 - “O mais novo símbolo do Brasil, um jegue”
3 - “Ovacionar uma toupeira dessas, é o fim da picada”
4 - “Vou tirar o meu título da parede e deixar só o de pós-doutorado. Se até o Lula (...) é doutor, me sinto diminuído”
Não são críticas políticas, apenas. Estas são legítimas e precisam ser feitas (na dúvida, leiam meu último post). Os comentários dos leitores, as perguntas dos jornalistas, as reações em alguns círculos sociais, demonstram um ranço preconceituoso que ainda persiste e um ódio de classes longe de ser superado.
Eu tenho orgulho. Independente de posição política – ou mesmo da avaliação que se faça sobre seu governo – tenho orgulho de viver em um país que elegeu para o cargo máximo da República um retirante saído do Nordeste em pau-de-arara, torneiro mecânico e líder metalúrgico, fundador do maior partido de massas da América Latina. Isso é prova de um povo maduro, que soube que somente um dos seus poderia entender suas dores. E isso, repito, me enche de orgulho.
Por fim, deixo o próprio Lula dar uma resposta a tanto preconceito. É uma resposta-desabafo. Esse vídeo é indispensável. Espero que vocês tenham paciência de ver até o fim. Um grande amigo, quando viu, soltou essa: “cara, sempre fiquei pensando se conseguiria explicar ao meu filho o que significou eleger o Lula presidente do Brasil. Para ele compreender a dimensão do que significa, agora já sei o que fazer: vou mostrar esse vídeo”. É exatamente isso.
(Lula fala adevogado. Fala "autoestima por si mesmo". Como alguns
devem se contorcer assistindo esse vídeo. Quem esse "anarfa" pensa que é?!)
devem se contorcer assistindo esse vídeo. Quem esse "anarfa" pensa que é?!)
3 comentários:
Muito bom o texto do nosso hermano!
Quem conhece um pouco a estrutura de tomada de decisão do Partido dos Trabalhadores sabe que Lula realmente soube fazer política bem feita e de forma democrática. O modelo foi replicado para o que hoje já ouvimos falar em algum momento, que são as Conferências (Saúde, Cidades, Juventude, ...). É o modelo que começa a discutir propostas e ações concretas nas bases e vai "subindo" até chegar ao topo. Que revolução política num país em que fomos acostumados a receber de cima as ordens concretas.
Só pra citar um exemplo do que o Lula fez desde a década de 80 até agora pelo Brasil afora
só deixando claro que não foi um modelo inventado por Lula ou pelo PT, mas que foi estimulado e difundido de forma mais abrangente por ele e seu partido.
Sempre antes de fazer qualquer comentário que envolva política, faço questão de dizer que não sou ligada a qualquer partido. Muitas pessoas pensam que sou petista, porque meu marido é petista e porque nunca escondi que votei no Lula e na Dilma.
Preciso dizer isso para concordar com isenção. Tenho orgulho por ter presenciado um homem que saiu lá do chão de terra batida para ocupar o Palácio do Planalto. E não fez feio. O governo dele sofreu todas as agruras que qualquer governo sofreria, inclusive corrupção, que não foi diferente em nenhum outro, principalmente do senhor doutor FHC. Mas ele respondeu a tudo isso com realizações importantes, resumidamente citadas aí no seu texto. E isso irrita. Faz muita gente rosnar. Como já tem gente rosnando pra Dilma, que faz cara feia pra imprensa, não é simpática à toa com ninguém e não abre as portas do gabinete pra qualquer um. Enfrentou as primeiras dificuldades com corrupção no governo com realismo, pé no chão, sem deixar a peteca cair. hahaha! Adoro isso.
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