05/08/2011

Meninos do Borel

Quando ele nasceu, a guerra já havia começado há pelo menos 15 anos. Oficialmente, ela nem existe mais. Mas o menino ainda vive a guerra, que nunca foi dele e que ele não escolheu participar.

Para os Meninos do Borel ir à Casa Branca é mais que simplesmente atravessar os poucos metros que separam as duas comunidades, vizinhas. É cruzar um muro simbólico (e, portanto, real) construído sob a lógica de uma guerra que, é importante repetir, os garotos não pediram para entrar, nem ao menos sabem seus reais motivos. Só sabem que é prudente ficar do Lado de Cá do muro.

“Vai que eles ainda estão olhando”, levanta um. “Se eu subir, vão me hostilizar”, acredita outro. “Lá são todos ‘alemão’”, sentencia um terceiro. Medo, dúvidas, temor do que existe do Lado de Lá – e de como o Lado de Cá vai reagir à travessia.

Mas alguns meninos resolveram desafiar a ordem imposta seja lá por quem. Decidiram caminhar alguns metros, cruzar as fronteiras, derrubar o muro. E então, neste processo, descobriram muitos outros muros erguidos para eles. E resolveram derrubar também.

Uma marretada e, bum!, a indiferença começa a ir para o chão. Outra marreta e colocaram o funk no último volume. Mais uma marreta e, pasme!, começaram a “invadir” um Rio de Janeiro que aparentemente não havia sido construído para eles: foram a cinemas, museus, teatros, até mesmo (olha que audácia!) pontos turísticos. Mexeram com as pessoas nas ruas, escandalizaram os mais "puros" e bradaram aos construtores e, sobretudo, aos mantenedores do mito da cidade partida: "Vocês vão ter que me engolir!"

E são tantos os muros erguidos, são tantas as marretas, são tantos os meninos... que não sei onde isso vai dar. Incendiarão a cidade? Unirão os rivais? Tomarão o poder? Não há quem saiba, afinal. Só sei que é bonito de se ver.

Em sua principal obra, Guimarães Rosa profetiza que “o sertão vai virar mar e o mar vai virar sertão”. Hermano Vianna, o antropólogo de sabedoria ímpar, traduz para a contemporaneidade a frase de Rosa: a periferia vai virar centro. Os meninos do Borel, mais simples, apenas desejam que essa divisão na faça mais sentido. Periferia e centro, favela e cidade, Borel e Casa Branca passem a ser a uma coisa só. Por que não?

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